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Nascido dia dois de dezembro de mil oitocentos e vinte e cinco o pequeno Pedro de Alcântara João Carlos Leopoldo Salvador Bibiano Francisco Xavier de Paula Leocádio Miguel Gabriel Rafael Gonzaga foi recebido com uma salva de três tiros representando a esperança monárquica em nosso país. O quinto filho de Maria Leopoldina de Habsburgo e Dom Pedro I foi considerado um deus europeu rodeado por mestiços. Sua aura sagrada aumentou com o fato de se tornar órfão de mãe com apenas um ano de idade e de pai nove anos depois. Para sua sorte recebeu carinho e amor de sua madrasta Amélia de Leuchtemberg, entretanto ela teve de acompanhar seu marido no retorno a Portugal deixando nosso pequeno príncipe sozinho novamente.
Sua infância foi tomada pelas responsabilidades de um futuro imperador. Possuía horários rígidos e vivia solitário enquanto era esculpido para se tornar mais eficiente do que seu pai na tarefa de governar um país. Os poucos momentos de lazer eram compartilhados com suas irmãs, no mais todo o seu tempo era dedicado aos estudos. Seus traços europeus compostos de pernas finas, voz estridente, queixo longo, olhos azuis e cabelos loiros ganhavam um ar muito sério dentro de suas roupas de adultos e gestos maduros. Aos quatorze anos de idade exibia um semblante compenetrado, mas a falta de barbas incomodada não só os liberais, mas também os conservadores. Era difícil confiar na eficácia de um monarca tão jovem.
Sua juventude podia incomodar, mas suas predileções impressionavam pelo rigor. Era amante do progresso e das ciências. Praticava equitação, esgrima, astronomia, engenharia, línguas mortas e vivas incluindo o tupi e o guarani. Com o passar dos anos sua sede de conhecimento só aumentava. A tranqüilidade financeira gerada pelo sucesso do café brasileiro no mercado internacional na década de quarenta lhe propiciou tempo livre para dedicar-se a seus hobbies. Desta forma ele se aproxima do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro com apenas vinte e dois anos de idade. Entre 1841 e 1864 Dom Pedro II se dedicou ao que mais amava: as ciências e as letras, se afastando do povo e recebendo noticias do país através de seu mordomo.
Somada a esse afastamento vieram outros motivados por seu desejo de conhecer o exterior e participar das Exposições Nacionais nas quais inseriu nosso país no ano de 1862. Nesta mostra o Brasil ficou reconhecido por sua diversidade exótica e variedade de matérias primas. Também criou a Exposição Nacional realizada no dia de seu aniversario. Guiado por sua curiosidade começou a praticar o daguerreótipo e mais tarde a fotografia. As imagens resultantes de seu trabalho, entre elas fotos, xilografias e óleos compunham a Coleção Tereza Cristina Maria. Essas obras revelavam o quanto era pequena a distancia entre sua vida publica e privada e foram doadas pelo próprio Dom Pedro II a sua terra natal assim que este foi banido daqui.
Como governante assumiu posse a partir do ato de coroação e sagração realizados no dia dezoito de julho de mil oitocentos e quarenta e um seguindo critérios bíblicos da religião católica. Sua opinião sobre antecipar sua maioridade ainda é desconhecida, mas sua aparência no ato da cerimônia segundo SCHWARCZ (1998 p. 107) revela que: “o pobre garoto assustado, com seus quinze anos, mal escondia o temor debaixo da roupa tão volumosa e desajeitada, da coroa pesada e especialmente esculpida para aquela ocasião”. Somando tão pouca idade não é surpresa que no inicio de seu mandato tenha somente representado as decisões oficiais que eram formuladas por seus homens de confiança, os mesmo que o conduziram ao poder.
Sua figura publica era bastante carismática, quando criança era visto como um monarca divino, já na maturidade alcançou o titulo de monarca cidadão. Suas aparições públicas incluíam festas negras e por isso conquistou tamanha simpatia popular. Os registros demonstram que até os anos setenta cada vez que aparecia ao publico estava rodeado por espetáculo, mas a partir de setenta e um se desfaz da roupa real, se veste como um cidadão de cartola e surge sem cerimônias na sociedade. Aos poucos se revela avesso as atividades sociais e já na década de oitenta praticamente não se afasta de seu palácio em Petrópolis devido ao inicio de algumas complicações médicas.
Com o tempo suas aparições se restringem ao necessário pra marcar presença nos eventos demarcando o caráter monarquista desse império tropical rodeado por republicas e visto com desconfiança. D. Pedro II se destacou por tropicalizar as tradições européias da corte, exatamente ao contrario daquilo que pretendiam seu pai e avô. Seu primeiro ato nesta tendência foi usar uma murça de penas de tucano junto de seu traje real, mais tarde ocupou a realeza com títulos advindos de tribos indígenas e escolheu símbolos nacionais bem americanos compostos por animais, vegetais e pessoas nativas do solo brasileiro.
Essa singularidade o transformava num mito. Seu semblante sério e sua fama de filosofo fizeram com que sua imagem mais recorrente fosse a de um governante idoso e cansado como é possível observar até hoje nos livros didáticos. Sofrendo de anemia, diabetes e pneumonia D. Pedro II virou motivo de chacota quando adormeceu durante uma audição no IHGB e as caricaturas se espalharam pelo país. Em mil oitocentos e oitenta todas as construções reais estavam em mal estado, desta maneira o descaso do monarca com suas obrigações de governante se torna evidente. Nem Petrópolis, seu recanto especial conseguiu escapar da degradação.
Construído para ser o refugio do jovem, Petrópolis teve sua vizinhança moldada para receber o nobre morador, ele mesmo escolheu cuidadosamente cada uma das pessoas que seriam honradas com os lotes vizinhos, os quais ele doou um a um. Este paço era o sonho de seu pai que realizou com o maior prazer, entretanto para dar um toque pessoal incluiu no projeto um viveiro de aves raras que tanto apreciava. Na medida em que se aproximava de Petrópolis ia deixando São Cristovão de lado por isso resolveu abrir este último a visitação durante os domingos, fez uma grande reforma na estrutura, construiu um herbário e começou a utilizá-lo como sede do governo.
Muito mais difícil do que encontrar o lar adequado para o imperador foi procurar a imperatriz ideal. Conseguir uma esposa para um monarca americano, jovem e escravocrata não foi tarefa fácil. As moças nobres em idade de casar-se não se interessavam no herdeiro de um reino distante, selvagem e sem tradição, como era de se esperar. Assim o encarregado de encontrar a pretendente européia enfrentou dificuldades em sua busca e apresentou opções modestas a Dom Pedro I entre elas estavam jovens da baixa realeza, muitas nem tão interessantes ou juvenis quanto o almejado. Quando:
A noiva foi então encontrada, e em 23 de julho de 1843 o adido José Ribeiro da Silva chegava com a escritura e um pequeno retrato de Teresa Cristina Maria, princesa das Duas Sicílias. Teresa era Bourbon por parte de três de seus avós, Habsburgo por parte da outra avó. Não sendo a família dela muito abastada, seu dote era, portanto, minguado. [...] Contam os relatos que o monarca, apesar de sua habitual moderação, afirmou ter gostado da imagem, que na verdade realçava apenas as qualidades físicas da futura imperatriz. No primeiro retrato aparecia uma jovem com belo penteado, um leve sorriso e cachinhos emoldurando um rosto gorducho. (SCHWARCZ, 1998, p. 128)
O fato é que a empolgação acabou assim que a noiva desembarcou no Brasil em três de setembro de mil oitocentos e quarenta e três. D. Pedro II não escondeu sua decepção ao avistar uma esposa baixinha, gorda, coxa, feia e quatro anos mais velha que o jovem governante que somava apenas dezoito anos de idade na época. Mas o casamento já havia sido promulgado via procuração, o jeito era habituar-se a sua consorte. Todos os retratos da família real evidenciam a falta de alegria e intimidade entre o casal. Os boatos não deixavam de revelar os adultérios do monarca, embora este tenha sido muito mais discreto do que seu pai em suas aventuras extraconjugais.
Vários historiadores acreditam que o verdadeiro amor de D. Pedro II tenha sido a Condessa de Barral. Com ela houve uma amizade aberta e repleta de carinhos que despertou a atenção popular, mas não há provas de que o romance realmente aconteceu. Embora tivesse varias amantes conhecidas pela população de forma bastante discreta eram as cartas da condessa que lhe faziam feliz. Alem das cartas a única distração imperial era com os assuntos relacionados a arte, as ciências e ao progresso. Os gastos nessas áreas eram modestos, mas a dedicação era tamanha que aos vinte e quatro anos de idade criou uma política cultural e afirmou: “a ciência sou eu”.
De tanto patrocinar pesquisas sobre o nosso país e apoiar profissionais estrangeiros de diversas áreas D. Pedro II acabou ganhando o titulo de mecenas das artes. Como o Brasil não possuía antiguidades nem castelos medievais ele deu ênfase a memória e a cultura indígena, criando um nacionalismo romântico onde os nativos eram vistos ora como vítimas do progresso ora como heróis da nação, pensando inclusive em criar uma gramática e um dicionário tupi guarani. Chegou a fundar uma biblioteca sobre lingüística e etnografia indígenas. Poliglota, se interessava por todas as línguas exóticas, entre elas apreciava consideravelmente o hebraico. Trabalhou em diversas traduções.
Financiou a Academia de Belas Artes e também médicos e hospícios da corte. Em mil oitocentos e cinqüenta e sete seu gosto pela ópera rendeu a criação da Imperial Academia de Música e também da Ópera Nacional. Dois anos mais tarde criou a Comissão Cientifica do Império. Mas dentre todas as instituições que criou nenhuma lhe rendeu mais prazer do que o Colégio D. Pedro II estabelecido em mil oitocentos e trinta e sete, este ficou conhecido com a menina dos olhos do imperador. Em suas instalações ele assistia a provas, selecionava professores e conferia as notas de cada um dos acadêmicos inscritos. Nas colações ele mesmo acompanhado da imperatriz entregava os diplomas aos alunos.
Seu apreço pela escola fica claro em uma de suas citações: “Só governo duas coisas no Brasil, minha casa e o Colégio D. Pedro II”. Mas além deste o monarca também acompanhava de perto os concursos nas escolas de medicina, politécnicas, militares e navais. Junto ao seu trono mantinha uma biblioteca, um museu, um laboratório e também um observatório astronômico que comprovavam o quanto apreciava a erudição. Era dedicando-se aos estudos que gostava de usufruir seu tempo livre afirmando que: “O estudo, a leitura e a educação de minhas filhas são o meu divertimento”.
A capital brasileira, na época o Rio de Janeiro, recebeu grande dedicação monárquica. Em mil oitocentos e vinte foi arborizada, em mil oitocentos e cinqüenta e quatro recebeu paralelepípedos, um ano mais tarde chegou a iluminação a gás, em mil oitocentos e cinqüenta e nove chegam os bondes a burro, em mil oitocentos e sessenta e dois acrescentou-se o esgoto e dois anos depois a água encanada. Surgiam as ruas comerciais repletas de casa de chá e cafeterias onde os integrantes da “boa sociedade” passeavam durante as tardes ensolaradas exibindo suas roupas finas. Os grandes solares dos ricos barões do café surgem em todas as localidades. A diversidade de teatros, bailes e saraus faz a capital ser reconhecida como o local mais divertido do país.
Na esfera política D. Pedro II agiu com bom senso atuando como uma balança entre liberais e conservadores através de seu poder moderador. Uma de suas primeiras ações foi distribuir honrarias, concedeu aproximadamente mil títulos dos quais trinta se destacam por terem sido destinados a mulheres, algo bastante peculiar. Essa nobreza recém criada não possuía bons costumes, andava descalça e desconhecia o uso de garfos na alimentação por isso o monarca mandou distribuir manuais de civilização pelo país. Essa concessão de títulos aumentou com o fim da Guerra do Paraguai e da escravidão. A guerra foi o momento em que o governante mais surpreendeu:
[...] o soberano participaria de modo ativo do conflito com o Paraguai e assumiria no campo da política a centralidade que já vinha obtendo na área cultural. [...] d. Pedro II assumia cada vez mais a imagem de “rei da guerra” — “o voluntário número um”, como diziam na época — e, sem dar ouvidos a ninguém, rumava para o sul, em 7 de julho de 1865 [...] (SCHWARCZ, 1998, p. 451-459).
Essa participação firme e ativa do imperador durante as batalhas lhe rendeu muito prestigio no inicio do combate, mas os acontecimentos fugiram do previsto, a guerra durou cinco anos e o governante foi culpado pela longevidade do conflito. Assim ao fim da guerra estava com a imagem arranhada e o corpo envelhecido. Seu exemplo de bravura foi esquecido e em seu lugar ficaram os angustiantes pedidos da abolição da escravatura que haviam sido deixados em segundo plano devido aos problemas no Prata. No fim de tudo todas as medidas abolicionistas acabaram sendo decretadas pelas mãos de sua filha Princesa Izabel que regia o país no lugar de seu pai ausente.
Os afastamentos de D. Pedro II lhe renderam os títulos de Pedro Banana e Pedro Caju, apelidos que revelam o quanto sua indiferença estava incomodando. Devido a pressões e governando em nome do pai Izabel promulga a Lei do Ventre Livre no dia vinte e oito de setembro de mil oitocentos e setenta e um, por exemplo, e sete anos mais tarde executa o ato mais conhecido de sua vida: concede a alforria aos negros cativos. Com o fim da escravidão a monarquia perde seu ultimo apoio, os ricos fazendeiros que viram sua mão de obra ir embora do dia pra noite. O declínio da monarquia era evidente e os boatos de um terceiro reinado a carga da princesa não passam de especulações.
O Baile da Ilha Fiscal realizado em onze de novembro de mil oitocentos e oitenta e nove se tornou o símbolo da queda monárquica no Brasil, o ultimo ato solene de um governo enfraquecido. O próprio marechal Deodoro da Fonseca encarregado de banir a família imperial não teve ousadia para tanto, preferia esperar a morte de D. Pedro II para proclamar a republica, mas com tanto alvoroço enviou dois subalternos com um telegrama em mãos para darem a noticia ao monarca que marcou a partida pras quatorze horas do dia seguinte, dezessete de novembro, entretanto exigiram uma partida imediata obrigando Pedro a abandonar sua pátria mãe na calada da noite junto dos demais exilados.
Em vinte e três de dezembro, poucos dias após a partida do imperador, acontecia um leilão dos pertences monárquicos e uma nova tradição começava a ser forjada pro nosso país. Surgiam datas e símbolos bem republicanos para apagar as lembranças do governo de Pedro da memória popular, a grande ênfase dedicada ao mais recente herói brasileiro, Tiradentes, é um claro exemplo deste esforço para apagar as tradições reais. Em quanto isso em Portugal D. Pedro II passa a viver de doações, sua esposa e melhor amiga falecem e seu neto é internado num hospital psiquiátrico. Acaba falecendo em cinco de dezembro de mil oitocentos e noventa e um sem abdicar o trono brasileiro, levando terra da pátria consigo e sendo homenageado por todo o mundo.
Um comentário:
Excelente e interessante artigo sobre D. pedro II. Parabéns!!
Roger
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