(Maquete produzida pela aluna Maeli da Silva Vitorino do 7ºV/2014 sobre a tribo Terena, nativa do Brasil) |
O livro: Guia politicamente incorreto da História do Brasil do jornalista Leandro Narloch trás em sua primeira abordagem uma figura tipicamente brasileira, o indígena. Entretanto Narloch rompe com a historiografia tradicional e utiliza novas abordagens para suas pesquisas. Suas leituras são de estudos posteriores ao ano 2000 e revelam um índio bastante diferente daquele exposto nos livros didáticos, ao qual ele chama de índio colonial. Vejamos por que.
O escritor aponta os erros cometidos pelas populações indígenas durante a colonização de nosso país e rompe com a convicção inicial de que foram apenas vitimas do processo, isentos de responsabilidade e participação. Cita acontecimentos registrados por historiadores renomados montando uma versão alternativa da história brasileira, mostrando os pontos inconvenientes antes ocultos pela tradição romântica que tornou o índio um ser mítico, inocente, em plena harmonia com a natureza e acima de qualquer contestação, praticamente um deus nacional.
As escolas nos mostram os indígenas completamente dissociados do convívio com os recém chegados do além-mar negando os registros que comprovam a intensidade dessa relação. Ainda em 1583 são criadas leis portuguesas proibindo os colonos de viverem nas aldeias em meio às festividades tribais. Em 1646 alguns padres jesuítas do Rio de Janeiro reclamavam da proximidade dos engenhos de cana de açúcar que propiciavam bebedeiras entre os indígenas. E no ano de 1755 muitos índios preferem abandonar a proteção das missões para viver entre brancos em vilas e engenhos.
As bebedeiras e festas envolvendo colonos e colonizados evidenciam que os confrontos não eram rotineiros, o escambo sim. Alguns como os indianos, não demonstraram interesse em trocar mercadorias com as tropas de Vasco da Gama por considerarem suas bacias, chapéus e azeites bastante primitivos. Mas em outros casos o interesse por produtos portugueses é tamanho que assusta o Padre Jerônimo Rodrigues que vê indígenas catarinenses oferecendo parentes em troca de roupas e ferramentas por volta de 1605.
O fato é que se houvesse solidariedade entre as tribos a conquista portuguesa jamais teria acontecido. Os colonizadores não eram onipotentes em terras estranhas, chegavam em dezenas portando um armamento lento e pesado enquanto os índios, que aqui estavam, eram milhões munidos de velozes flechas venenosas. Então como ocorreu a dominação? Simples, tribos rivais se uniram aos brancos durante as batalhas. Isso porque em pleno século XVI um tupinambá achava um botocudo tão estrangeiro quanto um português; lembrando que se trata de um país de dimensões continentais.
Com o colonizador vieram doenças desconhecidas e disputas territoriais, entretanto um isolamento social de aproximadamente 50 000 anos foi quebrado trazendo diversas inovações para o cotidiano americano como as técnicas de domesticação de animais, escrita, tecelagem, arquitetura em pedra, uso de metais e emprego de rodas. Anzóis, machados e facas metálicas diminuíram em até oito vezes o esforço pela busca de alimentos. A fauna e flora receberam novos componentes como coco, banana, laranja, tangerina, arroz, abacate, uva, jaca, manga, carambola, maçã, café, galinha, porco, boi, cavalo e cães.
Para que essas novidades alcançassem a costa o primeiro desafio era desembarcar das caravelas, os ataques as embarcações começavam antes mesmo que ancorassem como registrou Pero Vaz de Caminha em sua primeira carta a Portugal, ele relata que dois indígenas invadiram o convés da nau principal e começaram a provar novos gostos e observar novas tecnologias e animais exóticos. Enquanto africanos, asiáticos e europeus trocavam informações os americanos estavam completamente isolados e essa curiosidade acabou provocando um esvaziamento nas aldeias, muitos índios abandonaram seus costumes e migraram para os centros urbanos, o índio colonial.
Entre as informações trocadas entre as tribos brasileiras e os portugueses a mais marcante foi a permuta de dois hábitos. Os lusitanos descobriram o fumo e deixaram o álcool, costumes que ficaram no cotidiano dos dois países. A partir de 1750 quando os padres jesuítas foram expulsos do Brasil a proibição de brancos nas aldeias terminou, algumas delas foram transformadas em vilas e freguesias, algumas são cidades conhecidas atualmente, como Guarulhos, nesse momento a miscigenação se torna ainda mais comum dando inicio a exterminação indígena.
De 1500 aos dias atuais a população índigena foi reduzida em 10%, no entanto o número de brasileiros com DNA indígena aumentou mais de dez vezes. Algumas tribos do litoral, como os caiçaras, se misturaram pouco aos colonizadores, no entanto falam um segundo idioma e embora mantenham seus rituais já não se consideram uma população nativa. Desta maneira nosso país vai perdendo suas tradições aos poucos. O fundamental no texto de Narloch é analisar o quanto o próprio sujeito índio tem de responsável por seu “aportuguesamento”.
Os portugueses em sala de aula ainda são vistos como maldosos interesseiros, exploradores de riquezas e mão de obra, só que novas abordagens históricas já revelam que as tribos não eram tão conscientes com a natureza, muitas delas colocavam fogo nas florestas para cercar animais e começar plantações. Os jesuítas acabaram salvando a Mata Atlântica dessas agressões diárias quando trouxeram as técnicas de plantio aplicadas nas missões. Esse post é somente um resumo da obra de Leandro Narloch, a leitura do livro como um todo é fundamental, logo deixo a dica para todos os interessados no tema.
Sugiro que após a leitura você faça uma breve revisão de seus conceitos, pois como é possível perceber não existem somente heróis índios e vilões brancos, trata-se de um processo longo e repleto de controvérsias negadas nos matérias didáticos brasileiros. Nesse momento também é interessante fazer um apelo a nossos governos pra que resgatem a verdadeira história de nossas populações locais e valorizem suas tradições, algo tão belo não deveria ser menosprezado e esquecido, a desapropriação das aldeias na região onde será instalada a Usina de Belo Monte é um belo exemplo de ignorância e ganância que estamos assistindo bestializados sem qualquer esforço para conte-la, infelizmente. Eis o Brasil.
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