quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O cotidiano nas caravelas portuguesas

(Charge Mario Alberto)
Os dias de confinamento dentro das caravelas portuguesas eram desafiadores. Somente homens muito corajosos ou sem motivos para permanecer em Portugal ousavam se arriscar na busca além mar pelas especiarias orientais. As naus que seguiam para o oriente eram lentas e enfrentavam meses a deriva, já as caravelas que mais tarde eram enviadas para o Brasil eram menores, mais leves e desfrutavam de uma distancia consideravelmente mais curta, logo todas as adversidades que serão citadas a seguir eram, particularmente, mais comuns e intensas para os velejadores que seguiam rumo as terras do sol nascente.

As acomodações eram minusculas. Os marinheiros de baixo escalão dormiam todos juntos numa espécie de beliche de madeira, sem colchão, montada nos cascos das embarcações. Os oficiais de ponta desfrutavam de um pouco mais de conforto em algumas cabines particulares ou compartilhadas com alguns colegas de profissão. Banheiros não compunham o aparato naval, então as necessidades eram feitas em baldes ou pinicos. Os mais habilidosos se satisfaziam sentando na beirada do barco, contudo muitos desapareceram.

A alimentação compunha o maior desafio. Ao embarcar cada pessoa levava alguns mantimentos próprios que eram guardados em cavidades da embarcação. O abastecimento geral ficava por conta da coroa que nunca embarcava a quantidade realmente necessária de gêneros, até mesmo porque, era certo que apodreceria e seria desperdiçada. A água e o vinho a disposição ao fim do primeiro mês já era racionado e se encontravam em processo de putrefação. A comida era escassa, composta basicamente por biscoitos.

Cada nau contava com um único fogão e cozinheiro, este era encarregado do preparo dos alimentos de todos os embarcados, logicamente, acabava privilegiando aqueles que tinham condições de suborna-lo. O mercado negro de comida era uma prática enriquecedora. A falta de alimentos provocava o escorbuto, doença advinda da falta de vitaminas que ocasionava fraqueza nas articulações, inchaço da gengiva e perca dos dentes levando a morte. A fome levava ao desespero, loucura, suicídio e lançamentos ao mar.

Além do escorbuto, outras doenças aterrorizavam no mar. As infestações de pragas como piolhos e pulgas contribuíam com a atmosfera insalubre. Os médicos a bordo resolviam praticamente toda e qualquer doença com a aplicação de sangrias, o que, na maioria das vezes, levava o paciente a morte e provocava uma epidemia nos demais embarcados dependendo da enfermidade em questão. As mulheres quando atingidas por piolhos costumavam raspar a cabeça, mas perder os cabelos era o menor dos problemas para elas.

O maior perigo para as embarcadas era sem dúvida alguma o estupro. Conseguir evita-lo até o desembarque era praticamente impossível. Os marujos após semanas embarcados estavam praticamente loucos por uma mulher. A violação das crianças embarcadas era cotidiana e mesmo as orgias grupais não satisfaziam os desejos carnais dos homens em alto-mar. As prostitutas e mulheres pobres muitas vezes eram sequestradas na calada da noite e embarcadas contra vontade para suprir a demanda por sexo.

Muitas eram compartilhadas por até 5 homens simultaneamente, assim não é de se estranhar a ausência de mulheres nos navios, uma vez que sequer freiras, noviças e nobres eram poupadas da violência sexual. O homossexualismo se tornou a saída encontrada e os meninos embarcados eram os principais alvos de cobiça. As únicas datas respeitadas durante as viagens eram os dias santos, comemorados com festas e muito aguardados pelos tripulantes. Você pode aprofundar o estudo sobre o cotidiano dentro das embarcações portuguesas lendo Por Mares Nunca Dantes Navegados de Fábio Pestana Ramos. No próximo post vamos conhecer os principais perigos que essas viagens apresentavam. Até mais.

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